Antropoceno
Do vírus nipah ao coronavírus: destruição da natureza expõe ser humano a doenças do mundo animal
Em 1998, morcegos na Malásia começaram a migrar em busca de alimento. Desmatamento na região para abrir espaço para agricultura e pecuária havia eliminado suas fontes de comida. Estabeleceram-se em uma nova região onde havia produção de mangas ao lado de criações de porcos e passaram a se alimentar das frutas. Parcialmente comidas, elas caíam em cima dos porcos, que as comiam também.
Vírus carregados por morcegos muitas vezes não causam doenças neles. Em outros animais, contudo, esses vírus podem causar patologias graves. E foi assim que um vírus saiu do morcego, pulou para porcos, onde passou por uma mutação que o deixou mais perigoso para seres humanos. Depois, espalhou entre os porcos, vendidos entre fazendeiros, e finalmente pulou para pessoas.
Chamado de “vírus Nipah”, por causa de um vilarejo na Malásia, desde 1998 este vírus já infectou centenas de pessoas na Malásia, Cingapura, Bangladesh e Índia, com alta taxa de letalidade. É um exemplo de como a interferência do ser humano no meio-ambiente dá meia-volta e nos devolve doenças infecciosas, algo que cientistas apontam ser um problema recorrente e cada vez maior. (…)
Da BBC News Brasil em Londres; foto: Bahia
Matéria enviada pela colaboradora Shirley Albuquerque
Quarentena diminui poluição do ar ao redor do mundo
O novo coronavírus puxou o freio de atividades humanas. Quem agradece é o ambiente.
Poucos voos, menos carros circulando, industrias produzindo menos. Com o planeta focado em combater a pandemia de Covid-19, a poluição do ar caiu consideravelmente.
Em Nova York, o tráfego diminuiu 35% desde a chegada do novo coronavírus. Isso cortou as emissões de monóxido de carbono por automóveis pela metade, em comparação a 2019. Na china, epicentro inicial da epidemia, as emissões de CO2 caíram 25% em apenas 2 semanas, o que, segundo estimativas, pode resultar numa redução de 1% em 2020.
O total de NO2 na atmosfera também ficou menor de forma repentina no norte da Itália, um dos países mais afetados pela pandemia. Por lá a diferença foi de 40% – a diferença é tão grande que dá pra ver a mancha de poluição diminuindo em imagens de telescópio. O mesmo aconteceu em países como o Reino Unido, Alemanha e Holanda. O Brasil não ficou de fora: segundo a Cetesb, houve queda de 50% da poluição do ar na cidade de São Paulo uma semana após o início da quarentena.
A má notícia é que as reduções podem ser temporárias. Após o fim da crise financeira de 2008, por exemplo, as emissões subiram 5% repentinamente, como resultado dos estímulos financeiros ao setor de combustíveis. O receio é que os esforços para recuperar a economia joguem os ganhos atuais pelo ralo.
Supernovas – Fatos, Super Interessante, Edição 415, maio de 2020, página 11; foto: O Tempo
Rui Iwersen
DIA DO ÍNDIO
“Todo dia era dia de índio, agora eles só têm o dia 19 de abril.”
Música: Jorge Ben; foto: Shirley Albuquerque
Os males ocultos da poluição nº 7
Escapamentos e cigarro liberam monóxido de carbono e muito material particulado
Última edição desta série
(…) O Brasil está longe de ser um dos países mais poluídos do mundo. Esse posto fica com nações asiáticas abarrotadas de indústrias da área química e usinas termelétricas (…) [Mas] Se você mora na maior metrópole do Brasil, você é fumante. Não tem como fugir. Pode ser em maior ou menor escala, mas é.
Uma outra pesquisa feita pelo pessoal do Laboratório da USP avaliou o pulmão de mais de 400 cadáveres de moradores de São Paulo. As conclusões não foram animadoras. “Não dava para diferenciar quem era fumante e quem não era, de tanto material particulado que tinha lá”, disse Matera, que participou do estudo.
É como se todo paulistano fumasse pelo menos quatro cigarros por dia. Tanto os escapamentos como os cilindros de papel [cigarro] liberam monóxido de carbono e muito material particulado. O mecanismo dos dois é o mesmo: a combustão.
A diferença é o que está sendo queimado – combustível ou tabaco. Para os pulmões, dá praticamente na mesma: vira tudo fuligem lá dentro.
Maria Clara Rossini, Os males ocultos da poluição, Super Interessante, edição 412, fevereiro 2020, página 51; foto: ONU
Rui Iwersen
Os males ocultos da poluição nº 6
As consequências da poluição no cérebro humano
(…) Perder os cabelos, de qualquer forma, não é nada perto do que pode acontecer alguns centímetros abaixo do couro cabeludo: no cérebro. Ainda se sabe pouco sobre como a poluição alcança e afeta a massa cinzenta. Uma pesquisa recente do Laboratório de Poluição Atmosférica, porém, traz uma pista.
Os cientistas observaram um acúmulo de poluentes no bulbo olfatório, a área do cérebro responsável por processar os cheiros. Conclusão: em vez de pegar carona pelo sangue, as partículas provavelmente usaram uma via expressa para chegar à massa cinzenta pelo epitélio olfatório. Ele fica no teto da cavidade nasal e tem acesso direto ao cérebro.
Ainda não há indícios de partículas de poluição em outras partes do cérebro, mas talvez ela chegue lá. A poluição já foi relacionada ao aumento de riscos de Alzheimer, depressão e suicídio. (…)
Maria Clara Rossini, Os males ocultos da poluição, Super Interessante, edição 412, fevereiro 2020, página 50; foto: Dreamstime
Rui Iwersen
Os males ocultos da poluição nº 5
As consequências da poluição ao atravessar a pele humana
(…) O material particulado também pode entrar por outras vias, além do sistema respiratório. Da mesma forma que o material particulado consegue driblar as barreiras do pulmão, ele pode atravessar a pele.
A principal consequência do acúmulo de poluentes na derme está, é claro, na aparência: rugas precoces, olheiras, manchas, acne.
A queda de cabelo é um caso à parte. Um estudo de 2019 revelou o mecanismo de atuação do material particulado nas células do couro cabeludo. O PM10 afeta a produção de beta-catenina, uma proteína essencial para o crescimento de cabelo. Não menos pior: a exposição ao ar poluído ainda diminui a concentração de certas proteínas, responsáveis por manter o cabelo bem preso na cabeça (a CK12, a ciclina D1 e a ciclina E). (…)
Maria Clara Rossini, Os males ocultos da poluição, Super Interessante, edição 412, fevereiro 2020, página 50; foto: Conexão Planeta
Rui Iwersen
Os males ocultos da poluição nº 4
O efeito da poluição na reprodução humana
(…) Mesmo que haja fecundação, não significa que a gravidez vá para a frente sem percalços. Altas concentrações de material particulado também estão relacionados ao aumento de abortos espontâneos.
Pois é. Assim que o espermatozoide fecunda o óvulo, ele deve grudar na parede do útero para se desenvolver. Acontece que a poluição também bagunça todo o ciclo menstrual e a preparação da parede uterina. Dependendo do grau de intoxicação, ela não consegue sustentar o feto.
Um estudo feito com mais de mil mulheres na Mongólia examinou a relação entre abortos e a polição sazonal em Ulaanbaatar, a capital do país. Não deu outra. O pico de aborto sempre acontecia nos meses mais frios – os mais poluídos, já que as temperaturas baixas dificultam a dispersão dos gases e das partículas. (…)
Maria Clara Rossini, Os males ocultos da poluição, Super Interessante, edição 412, fevereiro 2020, página 50; foto: Sputinik News
Rui Iwersen
Os males ocultos da poluição nº 3
Os efeitos da poluição no corpo humano
(…) Quanto menor a partícula [sólida suspensa no ar], mais fundo ela consegue penetrar no corpo. A via respiratória é a porta da frente para a entrada de poluentes. Quando inalados, eles chegam até os alvéolos pulmonares, os responsáveis por enviar oxigênio para o sangue.
Lá nos alvéolos existe uma barreira formada por células “gigantes”, mil vezes maiores que o PM2,5. Esse obstáculo, então, é poroso o bastante para que partículas de 0,01 micrômetro cheguem ao sangue.
Uma vez na corrente sanguínea, eles alcançam lugares inusitados do corpo. Estudos recentes relacionaram a presença de PM2,5 na atmosfera com casos de baixa densidade dos ossos, condição que aumenta o risco de osteoporose.
A hipótese é que as partículas afetem a produção do hormônio da paratireoide, responsável por regular a concentração de cálcio no sangue. Sem esse mineral, os ossos perdem massa e ficam mais suscetíveis a fraturas, principalmente em idosos.
Para os mais jovens, há outros perigos. Já se sabe que os gases e o material particulado afetam a fertilidade tanto em homens quanto em mulheres. A quantidade e a qualidade dos espermatozoides diminui, enquanto a ovulação fica desregulada. (…)
Maria Clara Rossini, Os males ocultos da poluição, Super Interessante, edição 412, fevereiro 2020, página 49; foto: Dreamstime
Rui Iwersen
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