Saúde mental e meio ambiente
Freud Explica
A Guerra nº 4
A guerra se constitui na mais óbvia oposição à atividade psíquica que nos foi incutida pelo processo de civilização
A pedido de Einstein e da Liga das Nações (a atual ONU) Freud explica a guerra.
Prezado Professor Einstein
(…) As modificações psíquicas que acompanham o processo de civilização são notórias e inequívocas. Consistem num progressivo deslocamento dos fins instintuais e numa limitação imposta aos impulsos instintuais. (…) Dentre as características psicológicas da civilização, duas aparecem como as mais importantes: o fortalecimento do intelecto, que está começando a governar a vida instintual, e a internalização dos impulsos agressivos com todas as suas consequências e perigos. Ora, a guerra se constitui na mais óbvia oposição à atividade psíquica que nos foi incutida pelo processo de civilização.
Cordialmente, Sigmund Freud
Einstein e Freud, Por que a Guerra?, 1932-1933; Edição Standard Brasileira das Obras de Freud, Imago Editora, Rio de Janeiro, 1974, página 258 (pg. 16 do artigo original); foto: Guerra do Vietnã.
Rui Iwersen, médico psiquiatra
Matéria editada originalmente nesta página dia 14 de junho de 2015.
Freud Explica
A Guerra nº 3
O Instinto de morte torna-se instinto destrutivo quando é dirigido para fora, para objetos.
A pedido de Einstein e da Liga das Nações (a atual ONU) Freud explica as razões psicológicas das guerras humanas.
Presado Professor Einstein
(…) Receio que eu possa estar abusando do seu interesse, que, afinal, se volta para a prevenção da guerra e não para nossas teorias. Gostaria, não obstante, de deter-me um pouco mais em nosso instinto destrutivo, cuja popularidade não é de modo algum igual á sua importância.
Como consequência de um pouco de especulação, pudemos supor que esse instinto está em atividade em toda criatura viva e procura leva-la ao aniquilamento, reduzir a vida à condição original de matéria inanimada. Portanto, merece com toda seriedade, ser denominado instinto de morte, ao passo que os instintos eróticos representam o esforço de viver.
O Instinto de morte torna-se instinto destrutivo quando, com o auxilio de órgãos especiais, é dirigido para fora, para objetos. O organismo preserva sua própria vida, por assim dizer, destruindo uma vida alheia. (…)
Sigmund Freud
Einstein e Freud; Por que a Guerra? (1932-1933); Edição Standard Brasileira das Obras de Freud; Imago Editora; Rio de Janeiro; 1974; páginas 253 e 254 (11 e 12 no original); foto: guerra na Síria
Rui Iwersen, médico psiquiatra
Matéria editada originalmente nesta página dia 28 de janeiro de 2015.
Freud Explica
A Guerra nº 2
Quando os seres humanos são incitados à guerra, entre eles está certamente o desejo de agressão e destruição
A pedido de Einstein e da Liga das Nações (a atual ONU) Freud explica a guerra, como vemos no diálogo abaixo.
Prezado professor Freud
Para concluir: Até aqui somente falei das guerras entre nações, aquelas que se conhecem como conflitos internacionais. Estou, porém, bem consciente de que o instinto agressivo opera sob outras formas e em outras circunstâncias. (Penso nas guerras civis, por exemplo, devidas à intolerância religiosa, em tempos precedentes, hoje em dia, contudo, devidas a fatores sociais; ademais, também nas perseguições a minorias raciais.) (…)
Sei que nos escritos do senhor podemos encontrar respostas, explícitas ou implícitas, a todos os aspectos desse problema urgente e absorvente. Mas seria da maior importância para nós todos que o senhor apresentasse o problema da paz mundial sob o enfoque das suas mais recentes descobertas, pois uma tal apresentação bem poderia demarcar o caminho para novos e frutíferos métodos de ação. (…)
A. Einstein.
Prezado Professor Einstein
De acordo com nossa hipótese, os instintos humanos são de apenas dois tipos: aqueles que tendem a preservar e a unir – que denominamos ‘eróticos’, exatamente no mesmo sentido que Platão usa a palavra ‘Eros’ (…) -; e aqueles que tendem a destruir e matar, os quais agrupamos como instinto agressivo ou destrutivo. (…)
Muito raramente uma ação é obra de um impulso instintual único (que deve estar composto de Eros e destrutividade). A fim de tornar possível uma ação, há que haver, via de regra, uma combinação desses motivos compostos. (…) De forma que, quando os seres humanos são incitados à guerra, podem ter toda uma gama de motivos para se deixarem levar (…) Entre eles está certamente o desejo de agressão e destruição: as incontáveis crueldades que encontramos na história e em nossa vida de todos os dias atestam a sua existência e sua força.
Sigmund Freud
Einstein e Freud; Por que a Guerra?; 1932-1933; Edição Standard Brasileira das Obras de Freud; Imago Editora; Rio de Janeiro; 1974; páginas 244 (Einstein) (4 no original), 252 e 253 (Freud) (10 e 11 no original); foto: menina do Napalm, guerra do Vietnã
Rui Iwersen, médico psiquiatra
Matéria editada originalmente nesta página dia 30 de outubro de 2014
Freud Explica
A Guerra nº 1
Os conflitos de interesses entre os homens são resolvidos pelo uso da violência
Triste e preocupado com a guerra da Rússia contra a Ucrânia, inicio a reedição do quadro Freud Explica – a Guerra, onde apresento pequenas sínteses das referências de Freud sobre a guerra. Inicio com o diálogo entre Einstein e Freud sobre o tema.
Prezado Professor Freud
A proposta da Liga das Nações e de seu Instituto para a Cooperação Intelectual, em Paris, de que eu convidasse uma pessoa, de minha própria escolha, para um franco intercâmbio de pontos de vista sobre algum problema que eu poderia selecionar, oferece-me excelente oportunidade de conferenciar com o senhor a respeito de uma questão que, da maneira como as coisas estão, parece ser o mais urgente de todos os problemas que a civilização tem de enfrentar. Este é o problema: Existe alguma forma de livrar a humanidade da ameaça de guerra? (…)
A. Einstein.
Prezado Professor Einstein
O senhor começou com a relação entre o direito e o poder. Não se pode duvidar de que seja este o ponto de partida correto de nossa investigação. Mas, permita-me substituir a palavra ‘poder’ pela palavra mais nua e crua ‘violência’? (…) É, pois, um princípio geral que os conflitos de interesses entre os homens são resolvidos pelo uso da violência. É isto o que se passa em todo o reino animal, do qual o homem não tem motivo por que se excluir. No caso do homem, sem dúvida ocorrem também conflitos de opinião que podem chegar a atingir as mais raras nuanças da abstração e que parecem exigir alguma outra técnica para sua solução. Esta é, contudo, uma complicação a mais. (…)
De acordo com nossa hipótese, os instintos humanos são de apenas dois tipos: aqueles que tendem a preservar e a unir – que denominamos ‘eróticos’, exatamente no mesmo sentido em que Platão usa a palavra ‘Eros’ em seu Symposium (…) -; e aqueles que tendem a destruir e matar, os quais agrupamos como instinto agressivo ou destrutivo. (…)
Sigmund Freud
Einstein e Freud, Por que a Guerra?, 1932-1933; Edição Standard Brasileira das Obras de Freud, Imago Editora, Rio de Janeiro, 1974, páginas 241, 246 e 252 (páginas 1, 5 e 10 no artigo original)
Rui Iwersen, médico psiquiatra
Matéria editada originalmente nesta página dia 16 de outubro de 2014
Freud Explica
A Religião nº 10
As ideias religiosas surgiram da mesma necessidade de que se originaram todas as outras realizações da civilização
Tentei demonstrar que as ideias religiosas surgiram da mesma necessidade de que se originaram todas as outras realizações da civilização, ou seja, da necessidade de defesa contra a força esmagadoramente superior da natureza.
A isso acrescentou-se um segundo motivo: o impulso de retificar as deficiências da civilização, que se faziam sentir penosamente. Ademais, é especialmente apropriado dizer que a civilização fornece ao indivíduo essas ideias, porque ele já as encontra lá; são-lhe presenteadas já prontas, e ele não seria capaz de descobri-las por si mesmo.
Aquilo em que ele está ingressando constitui a herança de muitas gerações, e ele a assume tal como faz com a tabuada de multiplicar, a geometria, e outras coisas semelhantes.
Sigmund Freud, O Futuro de uma Ilusão, 1927, Imago Editora, 1974, página 33
Rui Iwersen, médico psiquiatra
Matéria editada originalmente nesta página dia 26 de abril de 2015
Freud Explica
A Religião nº 9
A expiação para com o pai pelo ato primevo culposo
Na doutrina cristã, assim, os homens estavam reconhecendo da maneira mais indisfarçada o ato primevo culposo, uma vez que encontraram a mais plena expiação para ele no sacrifício desse filho único. A expiação para com o pai foi ainda mais completa visto que o sacrifício se fez acompanhar de uma renúncia total às mulheres, por causa de quem a rebelião contra aquele fora iniciada.
Mas, nesse ponto, a inexorável lei psicológica da ambivalência apareceu. O próprio ato pelo qual o filho oferecia a maior expiação possível ao pai conduzia-o, ao mesmo tempo, à realização de seus desejos contra o pai. Ele próprio tornava-se Deus, ao lado, ou, mais corretamente, em lugar do pai. (…)
Na tragédia grega, o tema especial de representação eram os sofrimentos do bode divino, Dionísio, e a lamentação dos bodes seus seguidores que se identificavam com ele. Assim sendo, é fácil compreender como o drama, que tinha se extinguido, voltou a brilhar com nova vida na Idade Média, em torno da Paixão de Cristo.
Sigmund Freud, Totem e Tabu [1912-13], Imago Editora Ltda, Rio de Janeiro, 1974, páginas 177 e 179
Rui Iwersen, médico psiquiatra
Matéria editada originalmente nesta página dia 05 de abril de 2015
Freud explica
A religião nº 8
O objeto do ato de sacrifício sempre foi o mesmo, ou seja, o pai
Os cerimoniais de sacrifício humano, realizados nas mais diferentes partes do globo habitado, deixam pouca dúvida de que as vítimas encontram seu fim como representantes da divindade e esses ritos sacrificatórios podem ser remontados a épocas antigas, com uma efígie ou boneco inanimado tomando o lugar do ser humano vivo. (…)
Smith (1894) reconhece o fato de que o objeto do ato de sacrifício sempre foi o mesmo, a saber, aquilo que é hoje adorado como Deus, ou seja, o pai. O problema da relação entre o sacrifício animal e o sacrifício humano admite assim uma solução simples.
O sacrifício animal original já constituía um substituto de um sacrifício humano – a morte cerimonial do pai; assim sendo, quando o representante paterno mais uma vez reassumiu a figura humana, o sacrifício animal também podia ser retransformado num sacrifício humano. (…)
Sigmund Freud, Totem e Tabu, 1913; Rio de Janeiro, Imago Editora, 1974; página 174; foto: Rodrigo Peñaloza – Medium
Rui Iwersen, médico psiquiatra
Matéria editada originalmente nesta página dia 18 de abril de 2014
Freud explica
A religião nº 7
A competição entre “divindades” na antiguidade
“Quando o cristianismo pela primeira vez penetrou o mundo antigo, defrontou-se com a competição da religião de Mitras e, durante algum tempo, houve dúvida em relação a qual das duas divindades alcançaria a vitória. Não obstante o halo de luz que rodeia a sua forma, o jovem deus persa continua a ser obscuro para nós.
Podemos talvez deduzir das esculturas de Mitras matando um touro que ele representava um filho sozinho no sacrifício do pai, redimindo assim os irmãos do ônus de cumplicidade no ato.
Havia um método alternativo de mitigar a culpa e ele foi adotado pela primeira vez por Cristo. Sacrificou a própria vida e assim redimiu do pecado original o conjunto de irmãos.”
Sigmund Freud, Totem e Tabu, 1913; Rio de Janeiro, Imago Editora, 1974; página 176
Rui Iwersen
Matéria editada originalmente nesta página dia 25 de dezembro de 2013
Freud explica
A religião nº 6
O significado da natureza do sacrifício
“Esse pão, feito por Maria, ganho por José, alimentou o Filho de Deus; José sustentou no coração do Salvador, o sangue que Ele devia derramar por nós. Na eucaristia, nós recebemos a carne e o sangue de Cristo”.
Cassiano R. Azevedo; José – Referencial para o homem de hoje; Edições Shalom, Fortaleza, 2008, pg. 87
Freud
“A despeito da proibição que protegia a vida dos animais sagrados na qualidade de companheiros de clã, surgiu a necessidade de matar um deles de tempos em tempos, em comunhão solene, e de dividir sua carne e sangue entre os membros do clã. Os motivos que levaram a esse ato revelam o significado mais profundo da natureza do sacrifício.
Já sabemos como, em épocas posteriores, sempre que o alimento é comido em comum, a participação na mesma substância estabelece um laço sagrado entre aqueles que a consomem, quando o alimento penetrou em seus corpos. Nos tempos antigos, esse resultado parece só ter sido efetivado pela participação na substância de uma vítima sacrossanta. (…)
Este elo ou vínculo nada mais é que a vida do animal sacrificatório, a qual reside em sua carne e seu sangue, sendo distribuída entre todos os participantes na refeição sacrificatória.”
Sigmund Freud, Totem e Tabu, 1913; Rio de Janeiro, Imago Editora, 1974; página 159
Rui Iwersen
Matéria editada originalmente nesta página dia 12 de outubro de 2013
Freud explica
A religião nº 5
A oferenda de bebida consistia originalmente no sangue da vítima animal
“Reminiscências linguísticas comprovam que a parte do sacrifício atribuída ao deus era a princípio considerada como sendo, literalmente, o seu alimento. À medida que a natureza dos deuses tornava-se progressivamente menos material, essa concepção transformou-se num empecilho e foi evitada, atribuindo-se à deidade apenas a parte líquida da refeição.
Posteriormente, o uso do fogo, que fez com que a carne do sacrifício sobre os altares se elevasse em fumaça, forneceu um método de lidar com o alimento humano mais apropriado à natureza divina. A oferenda de bebida consistia originalmente no sangue da vítima animal, substituído mais tarde por vinho. Nos tempos antigos, o vinho era considerado ‘o sangue da uva’ e foi assim descrito por poetas modernos.” [Robertson Smith, 1894, páginas 224, 229 e 230]
Sigmund Freud, Totem e Tabu, 1913; Rio de Janeiro, Imago Editora, 1974; página 155; foto: Matriz Santo Estevão de Ituporanga
Matéria editada originalmente nesta página dia 16 de setembro de 2013
Rui Iwersen
Freud explica
A religião nº 4
A magia e o animismo prepararam o caminho para a criação de uma religião
Os ovos de Santa Clara que o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, encaminhou para as Irmãs Clarissas do Mosteiro da Gávea. Mais cedo o papa Francisco havia recomendado que ele colocasse ovos aos pés de Santa Clara para que a chuva parasse.
Nestes últimos exemplos, como em tantos outros do funcionamento da magia, o elemento da distância é desprezado; em outras palavras, a telepatia é admitida como certa. (…)
Se desejo que chova, tenho apenas de efetuar algo que se assemelhe à chuva ou faça lembra-la. Numa fase posterior da civilização, em vez dessa chuva mágica, serão feitas procissões até um templo e preces pedindo chuva serão dirigidas à divindade que nele habita. (…)
Enquanto a magia ainda reserva a onipotência apenas para os pensamentos, o animismo transmite um pouco dela para os espíritos, preparando assim o caminho para a criação de uma religião. (…)
Sigmund Freud, Totem e Tabu, 1913; Rio de Janeiro, Imago Editora, 1974; páginas 97 e 109; foto: BOL Fotos
Rui Iwersen
Matéria editada originalmente nesta página dia 31 de julho de 2013
24 de julho de 2021
Freud explica
A religião nº 3
Os motivos que conduziram os homens a praticar a magia são os desejos humanos
“Não é de se supor que os homens foram inspirados a criar seu primeiro sistema do universo por pura curiosidade especulativa. A necessidade prática de controlar o mundo que os rodeava deve ter desempenhado seu papel.” (…)
“É fácil perceber os motivos que conduziram os homens a praticar a magia: são os desejos humanos. Tudo o que precisamos admitir é que o homem primitivo tinha uma crença imensa no poder de seus desejos. A razão básica porque o que ele começa a fazer por meios mágicos vem a acontecer é, em última análise, simplesmente que o deseja. De início, portanto, a ênfase é colocada apenas no seu desejo.” (…)
“Para resumir, pode-se dizer, então, que o princípio que dirige a magia, a técnica da modalidade animista de pensamento, é o princípio da ‘onipotência de pensamentos’.” (…)
“Se estivermos dispostos a aceitar a explicação oferecida da evolução da maneira do homem visualizar o universo – uma fase animista seguida de uma fase religiosa e esta, por sua vez, de uma fase científica – não será difícil acompanhar as vicissitudes da ‘onipotência de pensamentos’ através dessas diferentes fases. Na fase animista, os homens atribuem a onipotência a si mesmos. Na fase religiosa, transferem-na para os deuses, mas eles próprios não desistem dela totalmente, porque se reservam o poder de influenciar os deuses através de uma variedade de maneiras, de acordo com os seus desejos.
A visão científica do universo já não dá lugar à onipotência humana; os homens reconheceram a sua pequenez e submeteram-se resignadamente à morte e às outras necessidades da natureza.” (…)
Sigmund Freud, Totem e Tabu, 1913; Rio de Janeiro, Imago Editora, 1974, páginas 94, 100, 102 e 105; foto: DarkBlog
Rui Iwersen
Matéria editada originalmente nesta página dia 21 de julho de 2013
Freud explica
A religião nº 2
A raça humana desenvolveu, no decurso das eras, três sistemas de pensamento: animista (ou mitológica), religiosa e científica
(…) O animismo [a doutrina de seres espirituais em geral] é um sistema de pensamento. Ele não fornece simplesmente uma explicação de um fenômeno específico, mas permite-me apreender todo o universo como uma unidade isolada, de um ponto de vista único. A raça humana, se seguirmos as autoridades no assunto, desenvolveu, no decurso das eras, três desses sistemas de pensamento – três grandes representações do universo: animista (ou mitológica), religiosa e científica. (…)
Ao examinar o fato de as mesmas ideias animistas haverem surgido entre os povos mais variados e em todos os períodos, Wundt declara que ‘elas constituem o produto psicológico necessário de uma consciência mitocriadora (…) e assim, neste sentido, o animismo primitivo deve ser encarado como a expressão espiritual do estado natural do homem’.
Com esses três estágios em mente [animismo, religião e ciência], pode-se dizer que o animismo em si mesmo não é ainda uma religião, mas contém os fundamentos sobre os quais as religiões posteriormente foram criadas.
Sigmund Freud, Totem e Tabu, 1913; Rio de Janeiro, Imago Editora, 1974; páginas 93 e 94; foto: Enciclopédia Global
Matéria editada originalmente nesta página dia 18 de julho de 2013
Rui Iwersen
Em Defesa da Ciência nº 25
A crítica e o pensamento criativo
(…) A crítica é essencial para o pensamento criativo. Cada avanço na aquisição de conhecimento cresce a partir do questionamento e da negação de conceitos estabelecidos. Nenhum avanço no pensamento pode ser dado sem que haja transcendência e, portanto, mudança de compreensão ou de formulações anteriores.
Copérnico rejeitou o conceito de Ptolomeu de que a Terra era o centro do universo, e demonstrou que ela é um planeta girando em volta do Sol. Darwin negou a visão escolástica de que Deus criara cada espécie animal, resultando daí a teoria da evolução. Einstein rejeitou a aplicabilidade da física de Newton aos fenômenos astronômicos, apresentando a teoria da relatividade. A psicanálise não teria posto a descoberto os segredos do inconsciente se Freud não houvesse abalado as ideias aceitas sobre histeria.
Essas aquisições foram possíveis porque cada um desses homens tinha ideias próprias e a coragem de dizer “não”. A mente inquisidora é o intelecto cético de uma natureza ávida e curiosa. (…)
Alexander Lowen, Prazer – Uma abordagem criativa da vida, Círculo do Livro S.A., São Paulo, 1970, página 153; foto: Interdimensionais
Rui Iwersen
Edito a partir de hoje os 10 números do quadro “Freud explica – a religião” editados nesta página, e que serão seguidos por novas edições sobre o tema.
Freud explica
A religião nº 1
O tabu é mais antigo que os deuses e remonta a um período anterior à existência de qualquer espécie de religião
Wundt descreve o tabu como o código de leis não escrito mais antigo do homem. É suposição geral que o tabu é mais antigo que os deuses e remonta a um período anterior à existência de qualquer espécie de religião. (…)
A punição pela violação de um tabu era, sem dúvida, originalmente deixada a um agente interno automático: o próprio tabu violado se vingava. Quando, numa fase posterior, surgiram as ideias de deuses e espíritos, com os quais os tabus se associaram, esperava-se que a penalidade proviesse automaticamente do poder divino. (…)
Nem o medo nem os demônios podem ser considerados pela psicologia como as coisas mais primitivas, impenetráveis a qualquer tentativa de descobrimento de seus antecedentes. A coisa seria diferente se os demônios realmente existissem. Mas sabemos que, como os deuses, eles são criações da mente humana: foram feitos por algo e de algo.
Sigmund Freud, Totem e Tabu, 1913; Imago Editora, Rio de Janeiro, 1974, páginas 32, 34 e 38; foto: Maiores e Melhores
Matéria editada originalmente no dia 16 de julho de 2013
Rui Iwersen
Freud explica nº 40
A agressividade nº 22
O sentimento de culpa como expressão da ambivalência e da luta entre Eros e o instinto de morte
(…) Matar o pai* ou abster-se de matá-lo não é, realmente, a coisa decisiva. Em ambos os casos, todos estão fadados a sentir culpa, porque o sentimento de culpa é uma expressão tanto do conflito devido à ambivalência, quanto da eterna luta entre Eros e o instinto de destruição ou morte. Esse conflito é posto em ação tão logo os homens se defrontem com a tarefa de viverem juntos.
Enquanto a comunidade não assume outra forma que não seja a da família, o conflito está fadado a se expressar no complexo edipiano, a estabelecer a consciência e a criar o primeiro sentimento de culpa. Quando se faz uma tentativa para ampliar a comunidade, o mesmo conflito continua sob formas que dependem do passado; é fortalecido e resulta numa identificação adicional do sentimento de culpa.
Visto que a civilização obedece a um impulso erótico interno que leva os seres humanos a se unirem num grupo estreitamente ligado, ela só pode alcançar seu objetivo através de um crescente fortalecimento do sentimento de culpa. O que começou em relação ao pai é completado em relação ao grupo.
Se a civilização constitui o caminho necessário de desenvolvimento, da família à humanidade como um todo, então, em resultado do conflito inato surgido da ambivalência, da eterna luta entre as tendências de amor e de morte, acha-se a ele inextricavelmente ligado um aumento do sentimento de culpa, que talvez atinja alturas que o individuo considere difíceis de tolerar. (…)
Freud, Sigmund, 1930, O Mal-Estar na Civilização, Imago Editora, Rio de Janeiro, 1974, páginas 94 e 95; foto: G1
* teoria exposta por Freud no livro Totem e Tabu de 1913
Rui Iwersen
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